Nos Países de Estado Democrático de Direito, a Constituição Federal é a lei máxima de um País, onde estão garantidos os direitos e deveres dos cidadãos. Nesse contexto, dispõe o inciso LVII, do artigo 5º, da Constituição Federal Brasileira que “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”.
Dito isso, poderia a decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal que rejeitou por 6 votos a 5 o habeas corpus preventivo julgado no dia 5 de abril, possibilitando, assim, a execução provisória da pena após condenação em segunda instância ser explicada sob a ótica do realismo jurídico?
Preliminarmente é importante observar que assim como o conhecimento científico em geral, o direito pode ser interpretado sob as mais variadas formas admitindo uma diversidade de teorizações a respeito de um mesmo objeto com ênfase em características diferentes. Logo, o direito não pode ser entendido como algo pronto e acabado, tampouco deve ser visto como dogmático. Daí a necessidade da constante evolução e criação de novas formas de enxergar e aplicar o direito.
Relativamente recente, o realismo jurídico teve sua origem no direito norte-americano, em meados do século XX, possuindo as suas bases no sistema da common law, onde a fonte primordial do direito é a jurisprudência. É definido como um conjunto de correntes filosóficas que defendem o direito como fruto de decisões judiciais, sendo isso mais relevante que a norma jurídica como base para a definição do direito. O texto de lei propriamente dito somente ganha sentido quando interpretado pelo julgador.
Nos Estados Unidos, o objeto central de estudo passou a ser a decisão judicial, tratada como um fato. Em linhas gerais, o direito é tido como fruto de decisões judiciais e exclusivo da mente dos juízes, sendo este o agente criador do direito. Por sua vez, o realismo jurídico escandinavo, passou a analisar o direito como um meio de comunicação humana, voltando-se a análise de conceitos jurídicos fundamentais e posturas comportamentais dos destinatários do direito, como um fato psicológico.
O modelo tradicional dessa corrente opera uma mudança de foco que passa da análise de regras e normas positivadas para uma análise do autêntico comportamento do operador do direito, em especial dos juristas. Provoca um desapego ao texto expresso da lei e teorias jurídicas dominantes e objetivas dando lugar a aproximação do direito à realidade de litígios e conflitos sociais, buscando-se, a partir de então, a solução mais coerente voltada a concretização da justiça.
Acima de tudo, orienta para a compreensão da realidade e do direito como produto de experiências e de realizações na sociedade. Em síntese, o direito é concedido como a prática jurídica derivada da experiência vivenciada através de fatos, decisões e mudanças que levam a determina conclusão. O realismo jurídico consagra uma resposta voltada cada vez mais aos fatos do que as leis propriamente ditas.
Para os realistas, é possível que um mesmo caso seja justificado por regras distintas, possibilitando a aparição de regras contraditórias que coexistam num mesmo ordenamento. Para esses estudiosos, o significado de um texto normativo não é único. Por conseguinte, não existe uma única resposta, o que confere ao julgador um poder discricionário na hora de decidir.
A proposta, então, é um contra-ataque ao direito tradicional, cujas decisões são tomadas por regras preestabelecidas. O modelo cria um sistema jurídico de acordo com a realidade social, senso comum e até mesmo questões de pessoalidade como verdadeiros motivos para a tomada de decisões.
Apesar disso, não há a desconsideração das normas de Direito. Ao contrário, a crítica é como elas são utilizadas, uma vez que, quando um fato pode ser compreendido juridicamente de várias maneiras, não há como se dizer qual delas é a correta, sendo a decisão judicial a correta aplicação do direito.
Mirielle Eloize Netzel
Especialista em Carreiras Jurídicas; advogada e coordenadora da área cível do Escritório Motta Santos & Vicentini Advogados Associados; assessora Jurídica da Confederação Nacional dos Transportadores Autônomos – CNTA, da Federação Interestadual dos Transportadores Rodoviários Autônomos de Bens do Estado do Paraná — FENACAM, e do Sindicato dos Transportadores Rodoviários Autônomos de Bens do Estado do Paraná – SINDICAM – PR.