Regularmente o Departamento Jurídico da Faciap vem sendo convocado a analisar a questão das feiras itinerantes, também denominadas popularmente de “Feiras do Brás” que se instalam no município, sem o devido alvará da Prefeitura e demais órgãos, ou até mesmo com o conhecimento e anuência do Poder Público Municipal, prejudicando especialmente os comerciantes do ramo de vendas de armarinhos e artefatos de casa e cozinha, entre outros.
Assim, questionou-se não só a existência de lei que regule a instauração destas feiras no Município, mas também a falta de fiscalização sobre elas; prática de concorrência desleal; evasão fiscal; pirataria entre outras irregularidades.
Para responder satisfatoriamente ao questionamento formulado, devem ser analisadas as legislações existentes, bem como as decisões judiciais acerca do tema.
No âmbito legislativo é possível verificar a existência de diversas leis municipais que regulamentam a matéria nos respectivos municípios. No âmbito federal, há apenas o Projeto de Lei n. º 7.586/2014, que conta com a Relatoria do Deputado Severino Ninho (PSB-PE) para parecer da Comissão de Defesa do Consumidor, que dispõe sobre a apresentação de produtos, conservação, identificação e informação quanto à origem, e ainda sistema de produção agro ecológico ou convencional. Assim, sua normatização encontra-se mais voltada à venda de produtos hortifrutigranjeiros e quase nada regulamenta em relação às feiras de produtos industrializados ou manufaturados.
Neste quadro, a promulgação de lei municipal visando regularizar as Feiras Itinerantes se mostra como medida necessária, considerando as diferenças entre o comércio local estabelecido de forma permanente, que arca com todos os ônus decorrentes da atividade e contribuindo para geração de empregos, arrecadação tributária e desenvolvimento local, e o comércio itinerante, exercido através de feiras eventuais e temporárias, muitas vezes oferecendo produtos com preços inferiores aos comumente praticados, o que beneficia os consumidores, mas ocasiona concorrência desleal. A regulamentação normativa deve instituir requisitos específicos para o licenciamento de tais feiras, com razoabilidade e em atenção aos princípios e normas constitucionais.
Este foi o entendimento proferido pelo Egrégio Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul ao julgar Ação Direta de Inconstitucionalidade sob n. 70043302520, promovida em face da Lei n. 3.055/2013 do Município de Canela/RS.
No mesmo julgamento, foi destacada a possibilidade de limitação de período de realização das feiras com a finalidade de proteger o comercio local:
“A vedação para realização de feiras itinerantes no período (15 dias) imediatamente anterior à Páscoa e durante os meses de julho e dezembro, que são justamente – como é notório – os meses de maior afluxo turístico, evidencia-se como norma de cunho protetivo ao comércio local e guarda amparo com o estabelecido no art. 13, II, da Constituição Estadual.”
Em contrapartida, foi declarado inconstitucional o dispositivo da Lei que previa a destinação “de parte da renda bruta resultante da venda de ingressos ao Município, ainda que para repasse a entidades assistenciais, o que tem efeito de confisco e configura tratamento desigual entre contribuintes”.
Na mesma seara, em análise ao mérito do recurso de Apelação interposto pelo Município de Londrina, em Mandado de Segurança que autorizou, inclusive em sede de liminar, a realização de Feira Itinerante no Município de Londrina, possível verificar que a concessão da medida ocorreu com fundamento na própria Lei do município que regulamenta a realização das feiras, vez que o Município não forneceu documento solicitado pela empresa organizadora do evento, mesmo cumprido os requisitos exigidos na Lei. Segue trecho do julgado:
“Veja-se que por um lado o impetrado exigia a documentação, cuja emissão era de sua responsabilidade, e por outro lado, negou o fornecimento do documento ao impetrante, impedindo-o de cumprir os requisitos legais necessários à obtenção do alvará e consequente realização do direito de promover a feira. Assim, merece ser concedida a segurança, confirmando a medida liminar que substituiu o alvará de funcionamento, em razão da ilegalidade praticada pelo Município e do direito de realização de feiras itinerantes, assegurado pela Lei 7.744/1999, em caso de cumprimento dos requisitos.”
Percebe-se que o abuso nos requisitos específicos para o licenciamento de tais feiras muitas vezes possibilita o ingresso de mandado de segurança por parte dos promotores das feiras itinerantes e, de acordo com pesquisa jurisprudencial, estes tendem a conseguir alvará para sua realização. Ademais, alguns casos pesquisados demonstram que os abusos encontrados na lei municipal geram Ação Direta de Inconstitucionalidade.
São razoáveis as exigências de aprovação pelas Secretarias da Fazenda e de Meio Ambiente, Trânsito e Urbanismo, de requerimento de realização do evento, bem como de apresentação de pareceres favoráveis do Corpo de Bombeiros e da Vigilância Sanitária, entre outras exigências que, de fato, regulamentem as feiras itinerantes, mas não tornem impossível sua realização, como a fixação de datas e locais em que as feiras poderão ser realizadas.
Desta forma, na redação da proposta de Lei à Municipalidade deve prever medidas exequíveis, bem como, deve se ater aos Princípios e Normas Constitucionais para que a lei seja cumprida sem a intervenção do Poder Judiciário, e tenha efetividade.
Assim, nossa orientação é que as associações comerciais trabalhem junto com os vereadores do seu município para que sejam apresentadas propostas legislativas coerentes e factíveis, que auxiliem a coexistência pacífica entre o comércio local e os expositores das referidas feiras.
Com o intuito de auxiliar as ACEs, segue minuta de projeto de Lei para que cada entidade possa adequá-lo a realidade do seu Município, para ser levado ao debate junto a Câmara Municipal.
Era o que tínhamos para o momento, sendo que nos colocamos à disposição para auxiliar no que for necessário.
Departamento Jurídico.
Alziro da Motta Santos Filho – Advogado especializado em Direito Processual Civil, pelo Instituto Brasileiro de Ensino Jurídico – IBEJ; especializado em Gestão em Direito Empresarial pela FAE Business School; e Legal Law Master – LLM, Direito Empresarial, pelo IBMEC – RJ. Sócio do escritório Motta Santos e Vicentini Advogados Associados e responsável jurídico para assuntos de Bureau de Crédito da Base Centralizadora Faciap de Proteção ao Crédito – BCF.
Caroline Alessandra Taborda dos Santos – Advogada responsável pelo Jurídico da Faciap.